As melhores cidades para negócios, de 30 de abril de 2014 é uma típica boa matéria da Revista Exame. Gostei particularmente da seção destinada a duas das cidades elencadas no ranking dos melhores destinos ao investimento, Rio das Ostras no Rio de Janeiro e Parauapebas no Pará. Antes de tudo, é bom que se frise de tratar de uma análise geral, isto é, não há um estudo detido por setor, que me levou a comprar a revista com a esperança de que encontrasse indicações de melhores centros para se investir em ensino, com cursos preparatórios (para concursos, vestibulares etc.). Os casos destas duas cidades, a do estado do RJ e do PA são sintomáticos de como decisões políticas e não, tendências econômicas já preestabelecidas podem traçar o futuro de uma cidade, a região que polariza e, por vezes, um estado inteiro. A cidade paraense vive com a renda gerada pela extração do minério de ferro pela Companhia Vale do Rio Doce (sim, aquela que, uma vez privatizada elevou sua participação, produtividade e competitividade globais) e que, se prevê estar apenas com mais duas décadas de matéria-prima abundante. Duas décadas... Pode parecer muito, quase uma geração inteira, mas é pouco se pensarmos nos investimentos necessários, a começar pela formação de mão de obra para diversificar a formação da riqueza local e regional. E o que está sendo feito? Absolutamente nada, além do que estou fazendo aqui: divagando. Quanto à cidade fluminense ocorre exatamente o oposto, a começar pelo investimento na faixa educacional mais importante, a do ensino básico. Consequentemente, enquanto a renda geral dos dois municípios aumentou (chegando a superar a da capital, no caso paraense), em uma delas, a renda dos mais pobres também cresceu acima da média nacional, que foi o caso de Rio das Ostras. Claro que nesta localidade, o impulso dependeu da captação dos royalties do petróleo que, por ser mais raro é também mais estratégico do que nossas abundantes reservas de minério de ferro. No entanto, nada mudaria substancialmente se este recurso não fosse bem aplicado. Administrativamente falando, Rio das Ostras é um caso raro, no qual apenas 30% do PIB da cidade é gasto com manutenção de servidores, enquanto que o limite dado por lei é de 60% e outros 20% são investidos no município. A cidade também foi uma das primeiras a criar seu Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano em 1999, com a particularidade de estabelecer uma zona especial para indústrias distante da orla turística. Bom senso básico ao procurar equilibrar uma atividade poluidora com o setor turístico, que nutre ojeriza a isto. Não precisou fomentar um conflito entre setores econômicos e, com a distância haverá tempo (este é outro desafio) para estabelecer planos de mitigação de externalidades negativas ambientais. Enquanto cresce (a população decuplicou em duas décadas), outro plano diretor é traçado para 2030. Quer dizer, bem ao contrário do que fazem outras municipalidades brasileiras, cujos planos de desenvolvimento urbanos servem para “tapar buracos” tentando, infrutiferamente, resolver problemas, o da cidade fluminense traça contornos para seu futuro.
E a
cidade de Parauapebas? Nada disso nem daquilo, apenas ostenta uma posição entre
as 100 mais violentas cidades do país. São 60,5 homicídios por 100.000
habitantes. Além do descaso que são sintomas comuns com a qualidade de vida da
população: na já vergonhosa taxa de esgotamento sanitário brasileira, que é de
48%, Parauapebas não vai além de míseros 13%. Mas é a 2ª melhor cidade do
Brasil com mais de 100.000 habitantes com potencial para receber novos
investimentos. E aí eu te pergunto, isto vale à pena?! Tendo outras
alternativas, alguém em sã consciência se mudaria para lá com seus filhos? Eu
não.
Agora
a cidade onde resido, Florianópolis. De cara, algo me chama atenção e não fecha
o raciocínio... Se há 39% dos empregados com ensino superior, contra a média
nacional de apenas 18%; 111 matrículas no ensino superior contra 37,
respectivamente; mas, o crescimento do número de empresas é pouco mais da
metade da média nacional de 20% e de empregos formais apenas 11%, também pouco
mais da metade do país, como é que é “tão bom viver aqui”? Para onde estão indo
estes trabalhadores que formam o “maior capital humano de uma cidade com mais
100.000 habitantes” no país? Por outro lado, os exemplos citados na seção, de
profissionais que largaram seus locais de origem, em outras cidades do estado
e, sobretudo, em outros estados são daqueles que pertencem ao topo da pirâmide
de empregados qualificados, cujos salários, embora perfaçam metade do que
poderiam obter fora, ainda assim são muito maiores do que os encontrados
localmente. Ora, o que faz a capital catarinense parecer “tão boa” é mais um
artifício temporário da demografia do que
uma tendência de longo prazo. Assim como cidade teve um boom de desenvolvimento
com a instalação de sedes de empresas estatais e universidades a partir dos
anos 70, com o turismo nos anos 80 e permeando tudo isto com a venda de imóveis
e terrenos (que ainda continua), a taxa de crescimento vegetativo é baixa
(sendo complementada pela imigração), o que compõe, seletivamente, o quadro
populacional sem miseráveis. Mas, eu duvido que isto se mantenha no longo prazo
se não houver investimentos mais pesados, como faz Palhoça, cidade da área
metropolitana. Vejam: o equilíbrio é a chave de tudo. Se investimentos
exclusivos, sem preocupação com o desenvolvimento social, como o caso de
Parauapebas criam uma bomba relógio, o caso florianopolitano apenas ruma à
estagnação e, talvez, decadência. Afinal, melhor capital humano sem emprego
dará em quê?
Rio
das Ostras leva a melhor, embora esteja em 16ª posição em um ranking de 100
cidades pesquisadas porque não vive do passado e elabora o 2º plano diretor;
investe em setores industriais, embora valorize o turismo; depende da riqueza
de um setor energético, mas elabora sua independência relativa do setor e
harmoniza o desenvolvimento equilibrando educação com renda (embora ainda falhe
na oferta de serviços de saúde). Se os dados colhidos pela Exame forem fiéis à
realidade, esta é minha opção de cidade exemplar. Não apenas pela sua posição
absoluta atual, que é apenas um flash da realidade, mas pelo filme todo, pois
saiu de uma situação de penúria e avança econômica e socialmente. Não tem essa
de que investir no setor econômico se dá em prejuízo do social, ou vice-versa.
Isto é balela de esquerda, os dois setores são necessários, obviamente porque
se complementam. Não há como ter uma boa mão de obra sem ensino e não há como
ter saúde e educação sem geração de renda pelas empresas. Lições tão óbvias que
não são ensinadas na maioria dos cursos de humanas do país devido à doutrinação
ideológica rasteira e sofista.
Em
tempo, não podemos nos esquecer ainda da boa gestão pública de Rio das Ostras,
fundamental, como conter gastos com pessoal sem transformar o setor público em
“cabides de empregos”, para tristeza dos sindicatos.
Rio
das Ostras... Quero conhecer.
(...)
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