Classes sociais existem, mas não são o
mais importante para entender a sociedade e, em segundo lugar, Marx não é e nem
nunca foi à última palavra no assunto.
O cerne da teoria social de Marx reside
no conceito de luta de classes, tanto que se tornou comum lermos uma de suas
mais famosas frases, presentes n’O Manifesto... “a história da humanidade é a
história da luta de classes”. Estúpido, pois em um mundo cindido por questões
étnicas, barreiras linguísticas, conflitos religiosos e disputas geopolíticas,
limitar a história da humanidade a um único tipo de conflito não é preciso. A
estratificação social é cada vez mais fluída, pois as classes sociais alteram
muito sua renda ao longo da história pelas redefinições do mercado, ao passo
que Marx as via como situadas em uma estrutura produtiva.
Mercado... Já viram como os marxistas
adoram reificar categorias dependentes de ações individuais como se tivessem
vida própria? O capital é seu melhor exemplo, pois parece uma entidade na
lógica da explanação marxista, como se fosse um nevoeiro que permeia os
indivíduos que, por sua vez, não portariam nenhuma consciência e autonomia
sendo meros títeres de seu poder. O que nos parece um completo absurdo faz todo
o sentido se pensarmos a partir do método marxista: para quem buscava um corpo
de teorias integradas, cujos fenômenos ou fatos sociais fossem explicados
basicamente por um a única causa ou fator, o pensamento marxista é um prato
cheio. Pensem na história como um motor e as relações de classe como seu
combustível, até que sua luta constitua veneno ou um ingrediente que corroa as
peças da máquina. Para Marx, este momento de destruição interna é uma passagem
de consciência coletiva, de “classe em si” para “classe para si”. Quando a
“classe subjugada” adquirir consciência da dominação sofrida estará configurado
uma situação pré-revolucionária.
A classe social em Marx porta um
conceito bem específico. As classes sociais ocupariam lugares próprios na
estrutura da produção e não podem ser divididas arbitrariamente, como fazemos, segundo
estratos de renda.[1]
Em segundo lugar não se trata de duas classes sociais apenas, pois assim não
haveria lugar para as chamadas “alianças de classe”, conceito fundamentais para
a análise política de Marx. Em um mundo onde posições de status, renda são
fundamentais para entender uma sociedade e seu modo de funcionamento,
circunscrever a análise a uma mera situação no mundo do trabalho é por demais
empobrecedor, sobretudo em classes sociais específicas da Inglaterra do século
XIX. Critérios culturais-informais como honra e status ou jurídico-formais como
cargos não teriam nenhuma importância para Marx em sua limitação economicista e
empobrecedora da realidade social. A estratificação social existe e conceitos
como renda, ocupação e status são centrais para sua análise, mas isto não
implica em adotar certos grupos como centrais em seu papel na história e com
relações definidas essencialmente pelo conflito. Se os indivíduos podem ser
agrupados por hábitos, consumo, desvios, saúde etc. não quer dizer que
correspondam, necessariamente, a classes sociais. Dar ênfase a este tipo de
estratificação, tão somente implica em submeter à riqueza da análise científica
à pobreza da militância ideológica. Isto já deveria ser consensual no atual
debate sobre o capitalismo, porque a sua época Marx estava mais preocupado com
questões econômicas gerais, ignorando por completo eventos cotidianos fora do
lugar de trabalho e que, hoje em dia, ocupam um tempo cada vez maior em nossas
vidas.
Um problema sintomaticamente ignorado
pelos marxistas, é que se fosse verdade que a história da humanidade é a história
da luta de classes, então a teoria das classes sociais deveria servir para
explicar coerentemente qualquer sociedade, seja aquela em que a propriedade dos
meios de produção fosse individual ou corporativa, pelo estado, igreja ou
grandes empresas etc. Mas, não é assim que funciona, uma vez que o
comportamento de mercado e formas de dominação mudou ao longo da história.
(...)
[1] E é exatamente isto que faz o autor deste artigo: http://www.nytimes.com/roomfordebate/2014/03/30/was-marx-right/a-return-to-a-world-marx-would-have-known, sem perceber que usa Marx sem conhecer seu método porque
hoje falar em desigualdade social parece ser domínio exclusivo de marxistas.
Tolice.
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