terça-feira, janeiro 10, 2017

Para que serve o poder público?


Certa vez andava com meu filho na nossa rua, uma dessas ex-servidões em Florianópolis e ele me perguntou por que ela estava toda esburacada. E eu aleguei a ação da chuva, do tempo etc. Daí, na maior ingenuidade me disse, “por que não arrumamos então?” E eu respondi que não era nossa tarefa, que a prefeitura cuidava disso que já pagav... “Prefeitura? O que é prefeitura?”, ele me interrompeu. Essa, eu confesso, foi a pergunta mais difícil que tive que responder. Como explicar algo tão abstrato a uma criança de 3 anos (hoje já com 4) que existe algo que não é alguém ou alguns que são incumbidos de fazer algo por nós, porque nós financiamos e deixamos de fazer nós mesmos o que, se juntássemos esforços locais faríamos melhor e mais rápido? Enfim, passou e faz tempo que não andamos na nossa rua e preferimos trilhas onde fica mais fácil, muitíssimo mais fácil falar de princípios de geomorfologia do que deveres do agente público.
Dias atrás conversava com minha professora, educadora física, uma pessoa que já fez três cursos superiores e não para de estudar. Ela tem um estúdio de pilates aqui no bairro e quer abrir uma clínica de fisioterapia, mas a prefeitura cobra dela que faça adaptações no seu imóvel, pois o segundo andar só tem um lance de escadas e deve ter um elevador para cadeirantes. Mas só a base para ele custa algo em torno de R$ 100.000,00 e só tem três empresas autorizadas pela prefeitura a executar a obra. Adivinhe se não tem esquema aí... Mas espere, não são dois andares, então a situação se resolveria se no andar térreo ficasse a fisioterapia e em cima, o pilates. Simples, qualquer ser racional deduziria isto e, claro que ela mesmo sugeriu isto. Como eu disse, qualquer ser racional, o que não é o caso de um fiscal da prefeitura que age sob outra óptica, outra racionalidade totalmente irracional para um ser humano que busca adequar meios a um fim específico com objetividade e sem deturpações. Ou sem dar chance para a corrupção.
É de um contrassenso absurdo, isto sem falar nas taxas anuais para operação que ela tem que manter já que não tem o habite-se porque não há esgotamento sanitário, assim como não há no bairro, assim como não há para 90% da cidade etc. E claro que haveria recursos se não houvesse tantas pessoas empregadas nesses “cabides públicos” sem fazer absolutamente nada, basta ver o que já foi transferido para a companhia de saneamento, a Casan.
Esta é a sina de ser um brasileiro, cujo poder estatal te obriga à ilegalidade. Faz alguns meses também, a Comcap, companhia que cuida da coleta de lixo e manutenção das vias públicas ficou, nada mais nada menos que 14 dias sem recolher nosso lixo na rua. Reclamação vai, reclamação vem por via telefônica, ouvidoria no site etc., nada resolveu. Mas nesses tempos de exposição on line (abençoado seja Zuckerberg!) procurei o facebook dos caras e em meia hora, o próprio diretor da empresa estava ligando para mim. É fácil deduzir onde e como passa a maior parte do tempo os funcionários da companhia... Inventaram uma mentira grosseira para mim, de que a rua estava muito esburacada, o que não procede. Não que não tenha buracos, pois como já disse, tem mesmo, mas não mais do que a maioria das outras ruas do bairro (a minha é uma das melhores). Daí perguntei se o motorista era novo e era mesmo só que o picareta culpou a via por ter corrido muito e arremessado um de seus colegas da caçamba. Como ficaram com medo de que eu expusesse toda a história vieram no dia seguinte, mas para justificar seu erro vieram podando galhos de árvores (que não tinha sido alegado como motivo do caminhão ter que desviar). Reclamei novamente em seguida porque mesmo assim, nada de coleta de novo! Vieram no mesmo dia às 22h!! Pergunto-me, para que serve o poder público brasileiro?!?!
Não fiquem achando que me refiro, exclusivamente, à Florianópolis. Se isto ocorre é porque resido na cidade há 11 anos. Em meus tempos de S. Paulo também passei por algumas... Naqueles verões na capital chovia aos cântaros e, numa dessas tormentas, os galhos das árvores da rua pressionaram os fios da rede de luz para baixo e batata! Queda de luz generalizada com direito à queima de aparelhos eletrônicos. Que que eu fiz? Liguei para a prefeitura para que providenciasse uma poda imediata, afinal estávamos só no começo da temporada de chuvas e recebi um número do protocolo do atendimento, cujo serviço deveria ser feito em um máximo de 45 dias! Sério?! Ah! Que bom né? Poderia ser um ano... Sempre temos que olhar para o lado positivo da coisa. Inconformado, liguei para a empresa que fazia a distribuição de luz, recém privatizada, AES-Eletropaulo e acredite ou não, em ½ hora os caras estavam cortando os galhos que tocavam nos fios. Não dá para entender quem reclama da privatização. Ou é mal informado ou tem interesses escusos a defender. Como sou obsessivo, próximo ao prazo limite de um mês e meio que me prometeram na prefeitura de S. Paulo, eu liguei novamente para saber se viriam e pasmem! Eles haviam perdido meu protocolo e tive que fazer outro para mais 45 dias! Ou seja, um total de 3 longos meses se passariam para o caminhão da prefeitura com seus incompetentes vir fazer algo, é mole? O verão com suas chuvas torrenciais teria acabado e os parasitas nem aí para quem os sustenta. É simplesmente ofensivo.
Quando os funcionários da AES estavam trabalhando com a poda dos galhos fui investigar e me disseram que quando os americanos compraram a companhia demitiram de cara, metade dos funcionários e viram que funcionava igualmente. Depois demitiram mais metade e continuou funcionando igual e fizeram mais uma vez... Para funcionar igualzinho! Em resumo, com 1/8 do staff da companhia mantinham a mesma produção, eles aumentaram muito a produtividade da empresa. Antes de pensar no lucro que tiveram, pense no prejuízo que nós tínhamos como pagadores de impostos por um serviço público de péssima qualidade. É este o raciocínio que devemos ter, mas como o cidadão brasileiro está tão acostumado (adestrado seria melhor) a achar que o serviço público é isso mesmo, só percebe o que os outros, empreendedores estão lucrando como se isto significasse um prejuízo para si. Uma visão completamente distorcida da realidade.
Florianópolis, São Paulo são as cidades que me lembro melhor, Porto Alegre já saí faz tempo, mas me recordo de meu pai dizendo que algum coitado apaixonado por árvores plantou várias em seu quintal, numa velha casa na Rua Marquês do Pombal, no bairro Moinhos de Vento. Daí, com o tempo é normal querer cuidá-las, fazendo a devida manutenção, mas não! Alguma repartição pública com uma pomposa sigla se dizendo ‘ambiental’, cujos funcionários iletrados passam o dia coçando resolveu sair do buraco mofado onde se escondem para proibi-lo. Típico, não? Pois é... E o sujeito ficou lá, com árvores velhas, apodrecidas prontas pra cair com estes vendavais pondo em risco a vida das pessoas. Mas, o que importa aos burocratas, já que zelar pela vida alheia não tem nada a ver com a tarefa monástica de preencher processos.
Vocês podem estar pensando: este cara escolhe problemas a dedo, exceções que confirmam a regra de que o serviço público no Brasil funciona meritoriamente. E eu pergunto vocês acreditam nesta mentira que contam pros outros? Na verdade eu estou descrevendo o corriqueiro. Quando eu fizer um artigo “o serviço público brasileiro que dá certo” é que estarei tratando de exceções que confirmam a regra. Então se alguém nunca simpatizou com teorias anarquistas de organização social saibam que é um bom momento para tanto. Não são minhas primeiras opções, mas no Brasil de hoje se impõem como necessidade, não há como confiar nos serviços públicos brasileiros que via de regra são um lixo mesmo. Mas por que é assim? Em primeiro lugar devido ao corporativismo com este monte de leis protecionistas visando garantir os direitos dos trabalhadores, mas direitos esses que se opõem aos direitos de seus consumidores, clientes, usuários etc. A sociedade brasileira opta por garantir direitos a si, enquanto categorias profissionais e não como indivíduos tratados com isonomia. Esta é nossa característica, cuja cultura política solapa qualquer projeto de desenvolvimento.
Esses dias um amigo meu teve a moto roubada aqui perto de onde resido. Obviamente, na vã esperança de que nossos serviços de segurança fizessem algo digno de seu nome, se guiou para a delegacia de polícia fazer um B.O. Chegando lá teve que ouvir um sermão do escrivão praticamente dizendo que ele era o responsável porque “deu mole” ao não ter alarme, nem cadeado na moto. Acabaram discutindo e o escroto do funcionário jogou a caneta com força em cima da mesa ao que meu amigo revidou com mais força ainda após assinar. O clima azedou ainda mais e pasmem, o covarde com distintivo ainda fez uma pose ao se levantar para que a camisa subisse mostrando sua arma. Paspalho! E é desses paspalhos que estamos cheios por aqui. Digamos então que isto não corresponda à maioria, que seja, mas a quem podemos recorrer nesses casos? Que tipo de proteção temos? É tão inusitada uma cena dessas em países onde o estado de direito realmente existe que mesmo um servidor escroto desses jamais faria isto, se não estivesse mentalmente perturbado, que as chances de sofrermos este tipo de ameaça são mínimas. Aqui não, basta não baixar o olhar para algo crescer e sermos intimidados por gente que não se coloca no seu lugar e nesse caso não sabe o que é proteger e servir. A mentalidade não é de proteger e servir, mas de intimidar e se servir.
Bem... Eu acredito no liberalismo e, embora eu ache os sonhos anarco-capitalistas um tanto apressados, sem que tenhamos desenvolvido uma cultura política e instituições começo a rever meus conceitos. Não há como melhorar isto a que chamamos estado brasileiro. Esta podre estrutura estatal precisa ser extinta.

Deixo vocês com um belo engraçado vídeo desses que sonhamos que um dia seja nossa realidade:




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