segunda-feira, janeiro 02, 2017

Subindo no vagão


Acabo de assistir à Homeland, esta fantástica série sobre espionagem, terrorismo e Oriente Médio, imperdível mesmo. Quem já pode assistir vai ficar na memória a excelente atuação de que interpretou Carrie Mathison (Claire Danes), a agente bi-polar da CIA, bipolar mesmo, pois sofria desse transtorno mental. A série tem quatro temporadas e ao cabo da terceira, a personagem principal – Carrie – perde quem se apaixonara, um fuzileiro (e ex-congressista... confuso?), Nicholas Brody (Damian Lewis) que havia se convertido ao islã e se preparava para cometer um atentado. Claro que neste ponto ele já estava em pleno dilema e atuava coagido, “cooptado” pela agência de inteligência. Na quarta e última temporada (até o momento, Netflix no Brasil) que, não sei porque me disseram que seria a menos interessante, pois achei justamente o contrário, o cenário é menos americano, iraniano e se passa em pleno Paquistão contra o Talebã. Nesta temporada, os dilemas de quem tem que atuar pela Razão de Estado, muitas vezes se aliando com antigos inimigos intensifica. Enfim, é muito para comentar aqui, mas uma coisa ficou clara para mim, quando tudo termina e um novo acordo parece se configurar entre um terrorista antes procurado e agora, um aliado da CIA, que vê nele alguém com potencial de estabilizar a região. “Que mundo nós criamos que nenhuma opção é correta?” pergunta Carrie, ao seu comparsa e nova paixão, Peter Quinn (Rupert Friend).

 

Corta agora... 2016 foi um ano de avanço e choque para o Brasil. Choque no freio ao projeto de poder do PT, cujas manifestações de rua foram um forte combustível para queimar a legenda e pressionar nosso judiciário. E um avanço paulatino, pois muita coisa não mudou e só vai mudar se os movimentos políticos que encabeçaram a pressão pelo impeachment e outros que , porventura venham surgir, evoluírem em propostas e métodos mais claros do que precisa ser mudado no país: nossa opacidade institucional, hipertrofia estatal e desigualdade sim, mas não a desigualdade socioeconômica que tanta alardeia nossa imaginativa esquerda e sim, a desigualdade jurídica. Em que pese nossas pollyannas, mais conhecidas como “operadores do direito” gostam de acreditar no contrário.

Alguns dos críticos, simpatizantes petistas, simpatizantes inconfessos e niilistas em geral dizem “o que mudou?” Realmente, se buscarmos uma revolução, nada mudou, apenas amenizou. Mas quando uma revolução foi bem sucedida no Brasil e na maior parte do mundo, mesmo? Este é o cuidado que devemos ter, a sedução revolucionária, como a de um enfermo com câncer que prefere acreditar em panaceias em um chá milagroso de medicina oriental a enfrentar uma arriscada cirurgia com pós-operatório complicado. O que irá mudar para as complicadas alianças da CIA com um Trump, só o tempo dirá, mas é este tipo de experimento que queremos com a sociedade brasileira? Ainda mais com o tipo de posologia intervencionista que fanáticos de direita (que não saem da frente do micro, nem tiram seus pijamas fedidos) propõem? Uma luta armada sem meta, sem projeto, apenas com o vago mote de acabar com a corrupção e defender o Brasil? Por acaso isto é diferente, em carga sentimental, do que a esquerda – os “comunistas” – fazem? Todos que não rezam a cartilha de direita são comunistas para eles. Esta gente sofre de verdadeiro tenesmo intelectual...

Imagem: blogfa.com
Se há algum sentido em marcarmos o tempo serve para perceber mudanças, tímidas que sejam, mas não para abandonar o passado, jogando fora o bebê com sua aguinha suja. Por que nos embasamos tanto em marcações de tempo chamadas datas? Justamente porque temos necessidade de entender uma transformação com uma expectativa de mudança, uma esperança. Mas quando se fala em ciclo da vida, não se espera por esta ascensão progressista, mas sim em um nascimento, crescimento, ápice e a inefável morte. No fim das contas, parece que nada mudou em nossa perspectiva de tempo, mas talvez sim em um prazo que não vislumbramos. É como se estivéssemos em um trem vendo a monótona paisagem da planície se descortinar ao nosso lado na janela, mas se pudéssemos subir no teto de um dos vagões e sentir toda sua amplitude e panorama teríamos outra visão, outras conclusões.

Esta necessidade de entender ciclos, além da esperança que constitui o que realmente não sabemos, mas desejamos, também corresponde ao nosso medo do desconhecido quando achamos que entendemos a mudança, que temos uma previsão de algo que está por vir. Daí que era esperado que nas manifestações e movimentos que formamos ao longo desses anos (de 2014 para cá), os mesmos fantasmas ressurgissem, ciclicamente, para nos atormentar, a esquerda burra, com seus sindicalistas de Q.I. de psitacídeo e uma direita igualmente limitada, paranóide e intervencionista. Se analisarmos por este ângulo, a pergunta vem novamente, o que mudou? Talvez nada de significativo, se não imprimirmos nenhum novo significado ao que percebemos. Ter fé para ver pode ser mais do que negar a fé que traz nossa visão, pode ser o que falta para experimentarmos algo novo. Despacito, despacito... Como deve ser todo ensaio e erro.



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