quinta-feira, julho 19, 2018

A Dualidade Interna


Eu não descarto essa possibilidade de um futuro muito mais “amigo do meio ambiente” e um tempo de sobra proporcionado pelo avanço tecnológico (robótica etc.) que nós sequer teríamos imaginado algumas décadas atrás. O que me torna cético é a visão de panaceia que alguns nutrem com isso e isso não quer dizer que eu não seja otimista com relação à tecnologia nem seja uma espécie de “tecnófobo” ou algo do gênero.
Não sou exatamente a pessoa que acorda como se estivesse em um comercial de margarina, muito pelo contrário… De manhã pareço mais um robozinho com pouca corda que fica batendo a cabeça na parede até que eu me sirva com um chima ou xícara de café. Sim, cafeína é vida! E isto vai determinar minha maneira de ver o mundo. Acho que felicidade se produz, enquanto que a ideia corrente é que somos tragados por ela como se estivéssemos flutuando sobre as turbulentas águas do rio da vida. Não, o posto de capitão é meu mesmo.
Não há como achar que outros fatores externos ao próprio indivíduo nos trarão felicidade. Mesmo quando se trata de uma droga necessária a nossa estabilidade, ela depende da interação com NOSSO organismo e não com o ambiente em geral. Sempre me impressionou como nas condições mais adversas, as crianças encontram alegria, o que na verdade significa PRODUZEM alegria.
Daí surge a questão de se o futuro com mais desenvolvimento tecnológico produzirá um mundo mais feliz, não, óbvio que não. Assim como também não produzirá um mundo mais infeliz. Será a mesma coisa a depender, claro, da percepção hegemônica sobre a época, em uma palavra, a IDEOLOGIA.
Isto sim é fundamental… Imagine o mundo como uma imensa floresta. Aliás, não só imensa, como DENSA. Tão densa que não conseguimos visualizar seus detalhes, os animais pequenos, esguios, peçonhentos por dentre as folhas largas das árvores e arbustos mais baixos e quando levantamos a cabeças temos apenas alguns fachos de luz penetrando por dentre as copas. Tentando compreender melhor o montante de informações que temos, abrimos a mochila e colocamos um óculos… Vermelho. Piorou. Colocamos outro azul e não distinguimos claramente o céu do dossel da floresta. Pomos um verde, outro amarelo, um roxo, um rosa e nada resolve. Tais óculos são ideologias, disponíveis e que se reproduzem como a nova linha de lentes e armações a cada estação. Por conta disso, muitos reproduzem o dito de um demente de que “não há fatos só interpretações”, o que é um erro grosseiro, pois basta caminhar um pouco para dar de cara com um tronco quebrando o nariz ou tropeçar nas raízes e beijar o chão. A realidade, assim como nossa selva está lá. Use o óculos que quiser e deforme sua visão, mas ela está lá.
É assim que eu vejo o passado, ou melhor, como veem o passado. No Pós-Guerra havia a ameaça de um holocausto nuclear; nos anos 70, a superpopulação e fantasma malthusiano da escassez de recursos; nos anos 80 e 90, o intermezzo da “Nova Ordem Mundial”, o fim do Comunismo no Leste e uma indelével onda de otimismo, mas com o temor ambientalista do Aquecimento Global; na virada do milênio, o envelhecimento das sociedades, a onda imigratória (que já existia) e o Choque de Civilizações. Não precisamos mesmo de nenhum Nibiru ou asteroide gigantesco em rota de colisão para alimentar nossas paranoias, mas se você perguntar a qualquer um de nossos profetas do apocalipse como foi o SEU passado, ele provavelmente lhe cantará odes a um “tempinho bom que não volta mais”, um idílico paraíso perdido. A verdade é que quanto mais clean fica nossa tecnologia, mais punk fica nossa alma.
É assim que vejo o futuro, as esperanças e imaginação se sobrepõem à experiência de que dias ruins intercalam-se aos bons, que dias ruins são bons dependendo da própria perspectiva. Nos dados brutos, nós vivemos mais, matamos mais, mas proporcionalmente menos, temos mais segurança, mas sentimo-nos menos seguros e reclamamos quando perdemos alguém para o câncer esquecendo que em menos tempo este que já foi perdeu alguém para uma infecção qualquer que nossas vacinas extirparam de nosso convívio. O conforto é tanto que até sobra tempo para criar um estúpido movimento antivax…
Mas existem riscos reais de que uma utopia se torne a distopia. Lembro-me sempre do Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley. Quando novas formas experimentais e criadas no laboratório da engenharia social são introduzidas sem levar em conta a vontade e associação entre as pessoas, o pior pesadelo pode sobrevir. Em um mundo onde o trabalho não seja mais um fardo porque ele deixe de existir ou seja irrelevante em tempo e custo, nossa orientação básica para viver também se extingue. Se não fui claro, sem um pouco de sofrimento, não se dará valor à vida e nem a família terá seu sentido de proteção e fidelidade valorizados. Um mundo em busca de êxtase perpétuo é um mundo sem troca e sem respeito. É o fim do que sobra de Humano.
Se o futuro e o passado têm seu aspecto positivo, mas também seus demônios encontramos a mesma dualidade no presente. O risco está em negar isto, ao buscarmos o super-herói como figura capaz de nos levar ao paraíso e prazer constante sem dilemas, dúvidas e dissensos. A necessidade de se conseguir alguém que seja nosso guardião é tanta que não suportamos alguém que fale o contrário. Nessa hora, o futuro facilitado pela mão de obra robótica forma um círculo que encontra o passado das tribos.
Anselmo Heidrich
19–07–2018
Para um ponto de vista plenamente otimista confira o link abaixo:

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