sábado, maio 07, 2016

A Fronteira




Um amigo já falecido me dizia que a fronteira cria dois tipos de homens, aquele que olha ao horizonte e pergunta como é lá e aquele que faz o mesmo, mas afirma que não há nada de bom para saber indo além. Eu sempre desconfiei de certezas categóricas ou das almas sem uma réstia de dúvida. No fundo, eu sempre afastei deste tipo de pobreza espiritual.

Mas quando uma frase cala fundo em mim, me trazendo o incômodo de que talvez tenha alguma verdade, por mais simples e generalista que pareça, não consigo deixar de considerá-la e testá-la. Não são os lugares, nem os “pedaços do mundo” que tem mais lucidez, são pessoas. E dentro desses “pedaços” há sempre dissenso. Ignorá-lo é o primeiro passo ao obscurantismo, que vem a galope novamente vibrando o solo como se avançassem sobre toda e qualquer forma de vida, desde que esta pense e divirja.
Cerca de 3,5% da população brasileira, se não mais... Esteve às ruas em uma de nossas últimas manifestações Brasil afora. Sem patrocínio estatal, sem vínculo partidário. Não querer entender a legitimidade desse processo é uma prova de suma ignorância individual e só com este tipo de mentalidade, que procura pelo em ovo, que procura atacar a coerência alheia com fabulosas teorias conspiratórias é que se pode construir a massa de manobra de um partido como o PT.
Antes de continuar que fique claro que não são “nós contra eles”, isto não é uma cruzada ideológica contra infiéis, mas sim uma guerra cultural que se busca libertar consciências para que decidam por si e não por “movimentos de massa”, pela intimidação ou discriminação em seu ambiente de trabalho e estudo. Em que pese nossas diferenças, se adotarmos as mesmas táticas nos tornaremos iguais ao que condenamos, com uma ou duas diferenças como defender a propriedade privada, ao passo que eles defendem o monopólio estatal. Isto basta? Não para mim. Por isto é importante que nos afastemos de agressões gratuitas, cuja forma e estética não se distingue de um cão da CUT. Para quem não captou o recado: temos que nos afastar de admiradores de Bolsonaro e excluí-los de nossas ações. Este tipo de ação até infantil, de birra e troça em detrimento da seriedade com que se deve tratar questões pertinentes serve, em primeiro lugar, ao inimigo, pois denigre nossa imagem.
O potencial da fúria, o potencial do ódio existe em todos nós, isto é óbvio. Tem que ser muito amorfo e insensível para não ter tido seu dia de fúria uma vez na vida. Na votação do impeachment pela Câmara dos Deputados, eu estava na lateral do telão, com amigos quando uma voz quase histérica nos atingiu “SAI DA FRENTE!” Isso não é exatamente o tipo de educação que se espera de quem demanda pela ética dos representantes públicos, mas esperar por um purismo ideal seria uma grosseira ingenuidade de minha parte. Há gente de todos os tipos de ambos os lados, o que nos distingue nesta disputa política é a defesa da Lei e da Constituição porque há uma razão implícita nisto. Ou se acredita nisto ou basta ser mais uma terra de ninguém, ou como um “pedaço não inteligente do mundo”. Ou construímos um sistema político pautado na lógica em acordo com a ética ou abortamos tudo e depois não venham reclamar, pois sobrará somente a força. E vocês petistas, já devem ter visto quem tem mais. Tudo que posso dizer a vocês, não apostem nisto que perderão. Embora eu saiba, no fundo que muitos de vocês desejam isto para concretizarem sua profecia (auto-realizável) que se trata de um “golpe”, já que todo seu discurso e raciocínio sempre foi pautado nisto, no auto-vitimismo sem estudo e propostas.
Na fronteira se cruza para conhecer, crescer com o comércio ou atacar. Neste front que nos instalamos, a batalha é iminente e pode ser dissuadida. A questão é permanecer com a razão, só que para tanto, não podemos, em hipótese alguma deflagrar uma “guerra preventiva”, como tantas vezes se viu. Neste tipo de conflito mantém razão quem usa os recursos necessários como defesa e nunca, como ataque. “O ataque é a melhor defesa” quando estivermos em luta contra exércitos e não se trata disto, quem está do outro lado não passa, na pior das hipóteses de um pobre ignorante que bem poderia ser teu filho, irmão ou amigo, não te esqueça disto. Aqueles que chutaram as costas de teus amigos, que te representaram são inimigos, não ignoro, mas nem todos com a mesma camisa vermelha o são. Conheço outros que falam em “golpe” que nunca pegariam em um canivete para manter sua falsa consciência tranquila. Se nós somos contra os coletivismos, não ajamos como coletivistas atacando o gado por causa de alguns touros.
Para quem conhece (e quem não conhece deve conhecer), a fantástica série Vikings do Netflix, no episódio 6, da 3ª temporada, o rei Ragnar é acometido pela dor de perder seu amigo, o padre ex-escravo Athelstan, morto por Floki, um típico xenófobo intolerante. Este devoto dos deuses vikings acreditava que os percalços de sua saga eram punição por seu povo guardar um infiel e o mata com prazer. Trata-se de uma época em que a conquista e anexação territorial eram tão legítimas quanto inquestionáveis. A diferença estava no tipo de estratégia adotada e o fruto que advinha do conhecimento de outras culturas. Isto fica claro com o passar do tempo, quando Ragnar prefere estabelecer acordos e se pautar pela coexistência pacífica, para decepção de alguns de seus súditos. No entanto, a violência não deixa de existir, pois ela é apenas o tempero da vingança pela traição.
Bem, quem discorda da Constituição tem todo o direito de fazê-lo, mas para mudá-la tem que se observar o método dentro da própria lei. Se você é mais um daqueles que endossa a força e a pressão fora desses limites da civilidade estará atraindo para si uma resposta similar e talvez, desproporcional. Se quiser trair o que acreditamos ser nosso meio de convívio para regular nossas diferenças, que é a Constituição, não se esqueça: estará atraindo a vingança e com ela, a violência. Portanto, quando nos olhar, para além das fronteiras que te cercam, venha em paz, como um mensageiro. Mas não se esqueça, se vier com as lanças em riste, esta pode ser a última vez que tua bandeira balançou ao vento.

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http://inter-ceptor.blogspot.com/
Fas est et ab hoste doceri – Ovídio

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