terça-feira, fevereiro 08, 2011

Enya e taenia




Acho que foi José Guilherme Merquior quem disse que "sou um liberal na economia, um democrata na política e um anarquista na cultura". Penso que os três princípios se complementem.
Não desdenho da anarquia como meio de possibilidade criativa, não. Só acho que é difícil ver qualquer anarquista dando continuidade a qualquer coisa. E não se trata de incapacidade ou "burrice", só de articulação, pois se chega a determinado momento a exigência de disciplina. E é aí que a porca torce o rabo.
No entanto, a importância que dou a cultura sem direção ou monopólio não é perfumaria. Os governos e regimes mais autoritários tendem a suprimir culturas que induzem a competição e esta, por si só, leva ao desenvolvimento. Veja onde uma URSS se desenvolveu, não foi no seu campo interno (agricultura, indústria de bens de base ou de consumo etc.), mas naquilo que exigia dela alguma competição, a indústria militar. Como um país que produziu os caças MIGs não conseguia fazer algo melhor do que um Lada na indústria automobilística? Não havia competição interna, só externa.
Então, o que me incomoda no anarquismo, pelo menos em muitas das formas que vejo por aí, é que se associa ao socialismo e socialismo pressupõe harmonia e a harmonia, por fim, suprime a liberdade de discordar. Por isto, uma sociedade mais justa significa a proteção da alteridade, de quem pensa e é diferente, e isto não se consegue perguntando a todos o que acham, sem uma dose de autoridade não se respeita os mais fracos. Ou é o mundo ocidental, democrático, estado de direito coisa e tal ou dá-lhe chibatada... O engraçado é que este mundo ocidental tende a valorizar tudo que vem do oriente, budismo, ioga etc. esquecendo que a China tem pena de morte, que na Índia tradicional hindu mulher não tem muita autonomia, que havia infanticídio feminino etc. Ou seja, criamos imagens convenientes para vender, crenças que nos confortam de um mundo que não é assim.
Não existe o mundo da Enya sem alguma taenia.
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