quinta-feira, maio 14, 2015

Sobre os erros no ensino da Geografia – 01


Imagem: pedrobendassolli.com

Por Anselmo Heidrich

De acordo com a matéria Onze erros comuns entre os professores de Geografia - Educador Brasil Escola http://educador.brasilescola.com/estrategias-ensino/onze-erros-comuns-entre-os-professores-geografia.htm, são erros da prática de ensino em geografia:

1.      “Não esclarecer o conceito de geografia e seus objetivos”. O engraçado é que a geografia, etimologicamente falando, deveria ser um dos campos do conhecimento mais claros que há, de maior simplicidade em seus objetivos. No entanto, com a afluência do marxismo nas ciências sociais e na geografia desde os anos 70, não é. Alias, ficou bem confuso saber o que é e o que não é a chamada geografia.

Mas, a geografia é uma “ciência social”? o problema começa justamente aí. Em minha opinião, não. Não porque ao tratar da distribuição e relação entre fenômenos na superfície terrestre, este campo do saber não se limita às praticas humanas e suas influências e consequências, por mais abrangentes que sejam hoje em dia. Um terremoto no Nepal, p.ex., pode ser estudado do ponto de vista do impacto que teve na sociedade nepalesa e seus vizinhos, bem como nas relações políticas e econômicas regionais e globais, mas também pode ser visto e analisado eminentemente por suas razões físicas, geológicas e impactos geomorfológicos, hidrológicos, biogeográficos etc. Ora, isto não é fugir da “realidade social”, mas avaliar algo que está ali há bilhões de anos que existe e continuará existindo por mais afetada que seja, a biosfera terrestre. Como já foi dito inúmeras vezes pelos marxistas, “a geografia não é uma ciência de síntese”, que queriam enfatizar o estudo da chamada Segunda Natureza, conceito presente na obra de Marx para enfatizar a lógica social do Capital que analisava. Mas o fato é que ela é sim, se situando na intersecção de vários campos do saber e esta é que é a sua especificidade, força e beleza, se me permitem a licença poética.
 Soa engraçado hoje em dia, quando a demanda do mercado por este tipo de profissional se torna crescente, os geógrafos neguem seu papel, consequência de seu ensino marxista. Não é a toa que surjam cursos como “administrador de cidades”, “gestor ambiental”, cujas atribuições e currículo são aquelas que já foram marcas registradas dos geógrafos. Depois não adianta reclamar que outras categorias “roubaram suas atribuições”. Na verdade, elas competem e ao ver a inoperância, inépcia e até negligência de muitos geógrafos aproveitaram a deixa.
 No entanto, por mais atraso que os ideólogos acadêmicos causem aos estudantes, as necessidades e interações humanas falam mais alto... Após décadas de doutrinação em salas de aula, congressos, encontros, colóquios etc., o estudo das informações geográficas, dadas opor imagens de satélite e fotos aéreas levou ao desenvolvimetno de um novo campo de estudos, o Sistema de Informações Geográficas (SIG, ou GIS na sigla em inglês). Também chamado de geoprocessamento ou geomática é ele quem tem fornecido empregos e gerado utilidade para este profissional que sai fresquinho da academia. Pesquisadores como foi o caso de Aziz Ab’Saber, dentre outros mostraram a importância da geografia física e fizeram com que esta ciência não perdesse o bonde da história com o crescimento da problemática ambiental. Se hoje temos geógrafos atuando ativamente neste campo e sendo úteis à sociedade se deve em grande medida a estes senhores. E isto que eu não estou avaliando a opinião de Ab’Saber sobre política ou economia, que era geralmente deplorável. Mas isto só mostra como sua prática científica era verdadeira, sendo imune e objetiva frente às suas opiniões. Leia e compare qualquer obra destes pesquisadores com a vaguidade de marxistas como Milton Santos e outros para entender claramente o que eu digo.
 Lembrar aos alunos qual a importância da ciência que se estuda com casos práticos e análises não deveria ser responsabilidade de uma única ciência. Se é cobrado isto da geografia é porque realmente não está claro o que ela faz e como faz. Isto não depende da definição de seu objeto, mas da clareza do que vem a ser um método geográfico. De que modo abordar um tema sem ser um estudo geológico, biológico etc? Esta é a questão.
 Eu acho que estes estudos existem, que tais métodos e abordagens também existem, mas se uma gama de profissionais não conseguem fazer algo mais do que um apanhado de informações sobrepostas da geologia, biologia e sociologia ou economia não são uma nova espécie de cientistas, sinto muito. No máximo sim, bons compiladores. Acho que a geografia pode se especializar em relacionar tais áreas e deve fazê-lo, do contrário abortem-na.
 Desde o século XVIII quando a geografia virou saber acadêmico, inicialmente na Alemanha, depois no resto da Europa até cruzar os oceanos no século XX, que a geografia não passava de um campo de saber organizado para justificar ou promover ações de estado, seja com o determinismo geográfico dos alemães, que seria inspiração para ações invasivas ou o possibilismo dos franceses, que afirmava, acertadamente, que o homem não é um mero produto de condições climáticas e/ou escassez de recursos naturais, sendo facultado a ele, a criação e construção de alternativas.
 Como se lê:

O grande erro dos professores de Geografia é realizar essa tarefa em apenas uma aula, durante um período específico do ano. Sempre que possível e necessário, é preciso lembrar aos alunos que a Geografia é a ciência que estuda o espaço geográfico, que aborda os seus aspectos naturais e humanos e que se baseia em importantes conceitos, como o de paisagem, espaço, lugar, região, território e muitos outros.


Dizer que um conceito é importante sem provar com análises sua importância não passa de doutrinação. Não se precisa dizer que a matemática ou o estudo de idiomas é importante, ele constantemente prova isto ao ser aplicado. De que modo a geografia é aplicada no cotidiano? Eu sei que sim, mas é justamente isto que precisa ser evidenciado aos alunos. Algum físico fala extensivamente sobre o significado e importância do conceito de energia para a sociedade? Claro que não. Ela mostra como se faz uso contínuo da energia e seu conceito é esmiuçado em estudos sobre situações. Qualquer caboclo tem noção do que seja a paisagem, o espaço, o lugar, uma região, o território etc. e há vários conceitos para isto, não precisamos de um teórico impondo um conceito à sociedade para com a mudança do significado se maquie uma nova cosmovisão para com isto empurrar goela abaixo seus objetivos... Escusos. Isto também não é uma teoria conspiratória porque não se trata de um segredo, algo articulado, pensado e aplicado metodicamente. Trata-se apenas de um cacoete burro de quem não questiona sua própria ação. Ao seguir o conselho dado para sanar o primeiro defeito do professor de geografia, o referido artigo está justamente asseverando vários defeitos cotidianos de quem não mostra o valor do conhecimento e método geográfico sem necessidade de propaganda ostensiva.
 Quando eu era estudante de pós-graduação na USP, lá pelos idos dos anos 90 perguntei à três físicos como eles estudavam o espaço, conceito em voga e moda na geografia marxista e pós-moderna da época, e me responderam com cara de confusos “em que sentido?” Não lhes parece óbvio que sem especificar o problema não há estudo válido, útil ou realmente importante? A importância de algo está na razão inversa da necessidade de dizer que é algo importante. Analogamente, se eu me apresento para uma entrevista de emprego devo deixar que minhas ações, palavras, provas, currículo falem por si e não minha afirmação de que “sou importante porque sou importante porque sou...” e assim por diante.
 Conceitos como o de paisagem para estudar a seca nordestina são úteis, mas sem quantificar o que se vê ou se sofre na paisagem nordestina, o estudo da seca não apresenta nada de novo. O como algo se processa é tão ou mais importante do que o que é este algo para que saibamos tirar proveito deste conhecimento. Para além de lembrar conceitos, o método de estudo é que é fundamental e daí, qualquer objeto pode se ser estudado dentro da geografia. Lembrar que algo é importante soa como catequização se não há possibilidade de questionamentos, dúvida e controvérsia até sobre a suposta importância de algo.
 Repetir mantras pode ser útil para prender alunos em sala de aula, adestrar cães ou estimular a fé de monges, mas não para fazer ciência.

(Continua ...)

14 maio de 2015

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