quarta-feira, fevereiro 29, 2012

Tragédia dos comuns no sushi nosso de cada dia

Mesmo sendo considerada 'artesanal', a pesca da tainha em Santa Catarina pode sofrer com seu incremento, que vai desde a Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul até o estado de São Paulo.

A produção de pescado em São Paulo está no limite devido à sobre-pesca, comum mundialmente e que agora estaria afetando as costas brasileiras:

Estoques estão no limite - vida - versaoimpressa - Estadão
Se não se respeita a época de reprodução dos cardumes, um dia irão diminuir os estoques parece óbvio. E não é por falta de lições neste sentido:

"Causes of the Crisis

Environmental Change And/Or Overfishing
Many theories have been offered to explain the unsettling news of the collapse of the northern cod stocks by 1992 and their subsequent failure to rebound. Again to summarize a much longer narrative, the theories included "the fish are hiding," "unusually cold water did them in," and "the seals ate them [or their food]."9 There are other interpretations, including the possibility that critical features of cod behavior are affected by low population size.10
Recent reviews of the data appear to confirm what seemed obvious to most observers, including Newfoundland's inshore fishers and fish-plant workers: the overfishing theory (Hutchings and Myers 1994; Myers et al. in press). So many fish had been killed by fishing that the population was reduced in size, in age-structure, and in ability to reproduce itself. Why?
Tragedies of the Commons (...)"
Acho que os liberais erram quando supõem que a natureza pode ser indistintamente explorada, mas também acho que eles acertam quando analisam a natureza como recurso que se torna exaurível devido à ausência de propriedade privada, i.e., a tragédia dos comuns, também conhecida como a tragédia dos bens comunais. Aqui em Santa Catarina, particularmente na Ilha de Sta. Catarina, esta história é bem conhecida, só que no que se refere a poluição hídrica. A falta de rede de esgotos conectada às propriedades facilita a contaminação e uma estação própria de tratamento é muito cara. Já que há poucos terrenos escriturados, i.e., com títulos definitivos de propriedade é raro que alguém se sinta na obrigação de cuidar do seu entorno. A ideia de preservação ou cuidados ambientais está diretamente ligada à propriedade privada.
A tragédia dos comuns é uma lógica econômica, real e atuante em nossas vidas diárias, na qual o que não pertence a alguém recebe menos cuidados e atenção no que se refere a sua preservação. Imaginemos um pasto comum onde todos nós temos uma ou duas vaquinhas. Como queremos engordar nossas unidades, as deixamos o máximo de tempo possível na área que, ano após ano, recebe novos membros devido à reprodução do gado. Com o tempo, certamente, não haverá pasto suficiente para o sustento adequado, a engorda de todos os animais. E se houve um período em que aumentou a produtividade (quilo/hectare), mais adiante ocorre uma inflexão desta tendência ao diminuir a fonte de alimento. Ou seja, o gado engorda, aumenta, engorda para emagrecer e diminuir.
Se isto se limitasse ao gado não seria tão ruim, mas como afetará o ecossistema local com a provável redução da água dos mananciais pelo gado ou, indiretamente, pela perda de vegetação (normalmente, os criadores desmatam áreas maiores para plantarem mais pasto). Neste estágio já temos um nível d’água subterrâneo mais baixo que dificulta a recuperação da vegetação, inclusive aquela mais pobre que precisa menos de água, o caso da vegetação herbácea que serve de fonte de alimento para os bois e vacas.
Qual a origem disto tudo? Na falta de planejamento e pouca intervenção estatal... Mas, qual seria a melhor “intervenção estatal”? Neste caso, intervir em prol da propriedade privada e impedir a exploração em áreas públicas. Se fosse uma produção predominantemente pautada em lotes privados, os proprietários teriam que garantir a preservação de seus estoques de biomassa para não perder cabeças de gado e manterem sua produtividade. No caso da pecuária bovina utilizada como exemplo, já é assim, mas no caso da pesca em alto mar, não porque não há propriedade privada na água. Este é o ponto de origem do problema que tem sido parcialmente sanado com a aqüicultura, pois esta apresenta limites definidos de área para cada criador. O problema é que certas espécies são migratórias e sem respeito a este movimento não se reproduzem. Daí, só com planejamento e manejo ambiental mesmo.
Mas, como nossos estados, no caso o de São Paulo e Santa Catarina (que detém a maior frota pesqueira) têm atuado? A matéria dá a dica neste trecho:
Os dados [referentes a produção nacional de pesca extrativa marinha] do MPA [Ministério da Pesca e Aqüicultura] referem-se somente ao período de 2007 a 2009. Não há série histórica. O próximo Boletim Estatístico da Pesca e Aquicultura, com dados de 2010, está previsto para abril.
A defasagem temporal deve-se a uma falta crônica de acompanhamento estatístico do setor. São Paulo e Santa Catarina são os únicos Estados que monitoram de maneira consistente sua produção pesqueira. E, ainda assim, mesmo nesses dois Estados, o déficit de informações é grande, segundo Carneiro. "Se estamos vendo esse declínio em São Paulo com os dados que temos, imagine se tivéssemos todos os outros dados que precisamos", diz. "O valor real da queda é provavelmente muito maior.
"A melhoria das bases de informação, defende Carneiro, é essencial para a formulação de políticas de proteção, recuperação e sustentabilidade da pesca. "Sem informação não se faz gestão.
"Os dados de produção pesqueira têm como referência o local onde o peixe é descarregado e não onde ele foi pescado. O que deixa à deriva a seguinte questão: a produção pesqueira de São Paulo está caindo porque há menos peixes no mar, ou porque esses peixes estão sendo pescados em águas paulistas e descarregados em outros Estados?
Não há restrições geopolíticas à área de atuação do barcos. As embarcações vão aonde o peixe estiver, até onde seja economicamente viável pescá-lo.
Santa Catarina. A principal frota de pesca industrial do País é a de Santa Catarina, com cerca de 700 embarcações. A produção do Estado tem se mantido relativamente estável nos últimos dez anos, com um aumento de 8% entre 2001 e 2011, segundo dados do Grupo de Estudos Pesqueiros (GEP) da Universidade do Vale do Itajaí (Univali). "Não vemos uma tendência de queda por aqui", diz o pesquisador Paulo Ricardo Schwingel, do Centro de Ciências Tecnológicas da Terra e do Mar (CTTMar) da Univali.
Muitos barcos catarinenses operam em outros Estados. Por exemplo, na costa fluminense, onde a pesca da sardinha foi melhor nos últimos dois anos. Mas não em quantidades suficientes para explicar a queda na produção de São Paulo, segundo Schwingel."
Acho pouco plausível que barcos catarinenses estejam tirando peixes dos barcos de São Paulo", diz o pesquisador. "É mais plausível que seja uma redução dos estoques pesqueiros mesmo; algo relacionado diretamente à disponibilidade do recurso no ambiente." Mais da metade do pescado desembarcado em Santa Catarina, segundo ele, é pescado no próprio Estado.
“Sem informação não se faz gestão”, muito bem. Então, sem base estatística suficiente e confiável, como administrar, sobretudo recursos comuns, os chamados bens difusos? Onde estão a atuação e compromisso estatais aí? Não estão... E se não ficou claro, quem monitora o setor em Santa Catarina é uma universidade privada, a Univali. Se for assim por que manter o controle por órgãos que não são presentes? Estatística é o básico do básico para tudo no que se refere à administração e se isto não tem sido feito, os recursos para este fim estão sendo gastos onde? Por água abaixo é que não é.
...

Nenhum comentário:

Postar um comentário